7 de novembro de 2018

A Criação Restaurada: base bíblica para uma cosmovisão reformada: uma resenha


WOLTERS, Albert M. A Criação Restaurada: base bíblica para uma cosmovisão reformada.  Trad. Denise Pereira Ribeiro Meister. 1 ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006. Original em inglês: Creation regained (1985).

Este livro de Albert W. Wolters trata do tema cosmovisão da perspectiva bíblica e reformada.  Revela a sua não originalidade sobre os temas do livro dizendo que deve a personagens cristãos como Tyndale e Calvino e alguns escritores da linha do neocalvinismo holandês como Abraham Kuyper, Herman Bavinck, Herman Dooyerweerd e H. T. Vollenhoven.
Para os propósitos do livro, ele conceitua cosmovisão como “a estrutura compreensiva da crença de uma pessoa sobre as coisas”. Embora sua definição seja curta, a abrangência do significado abrange todas as coisas e como as pessoas, grupos ou sociedades pensam e vivem através dessa compreensão, uma vez que todos, mesmo que tacitamente, acreditam no significado daquilo que concluem acerca do mundo e assim modelam suas práticas.
Ainda no primeiro capítulo ele reconhece que há algumas distinções dentro da fé cristã sobre cosmovisão. Ele dá o exemplo de Herman Bavinck que conceitua a fé cristã de modo abrangente como toda a realidade criada. Eis a definição: “Deus, o Pai, reconciliou o seu mundo criado, mas caído, por meio da morte de seu Filho, e o renova num Reino de Deus pelo seu Espírito”.
Para Wolters, além da formula ser trinitariana, sua cosmovisão cristã abrange todo o propósito de Deus sobre todas as coisas. Ou seja, a criação (tudo que existe), a queda (o pecado e o mal no mundo) e a redenção (o que Deus fez para redimir o homem e o restante da criação por meio de Jesus Cristo).
Segundo ele, as outras cosmovisões cristãs são dualistas aplicando as verdades de Deus apenas para uma parte da humanidade, os próprios cristãos. Como se as outras relações e empreendimento humanos, e o próprio mundo, fossem esquecidos pelas verdades de Deus. O dualismo ou a dicotomia não expressa a integralidade da visão de Deus sobre tudo. Esse dualismo é expresso na cosmovisão sagrado/secular, religioso/natural-profano. Assim ele faz uma distinção da cosmovisão reformada e as outras cosmovisões cristãs.
Os próximos três capítulos Wolters aplica o conceito até agora abstrato às realidades de toda a nossa experiência social e cultural ao fio teológico unificador de toda a Escritura: Criação-Queda-Redenção.
Assim no capitulo 2 fala sobre a Criação. Apresenta o duplo significado da palavra Criação. O modo como Deus aplica a sua lei sobre o cosmo, que é de modo direto (sem mediação) ou indireto (envolvendo as ações humanas).  As leis diretas são aplicadas a natureza, as chamadas leis da natureza que o homem não pode mudar, enquanto as normas se aplicam ao seres humanos, nas suas mais amplas realizações como relacionamentos interpessoais, cultura, Estado, administração da agricultura e tudo mais. “Os estatutos e as ordenanças de Deus estão sobre todas as coisas, certamente não excluindo o amplo domínio dos assuntos humanos” (p.28). Enfim, há uma lei geral para a criação. O autor ainda faz uma distinção entre a lei geral e particular. Ainda nesse capítulo estuda o conceito da “Palavra de Deus na criação”.
A própria Bíblia revela que por meio da criação o próprio Deus se revela (Sl 19.1-4; At 14.17; Rm 1.18-20). Ele assim mostra que o conhecimento da criação é o fundamento para toda a compreensão humana, “tanto da ciência quanto na vida diária”.
Embora o pecado tenha maculado o mundo, em suas relações sociais, culturais e religiosas, os planos e leis de Deus continuam sendo seu projeto para todas as coisas. Isso não deve nos deixar inocentes para o processo de secularização da ciência, tecnologia e economia. A lei de Deus abrange essas áreas também, o que nos livra da dicotomia sagrado/religioso.
No capitulo 3, ao continuar a desenvolver uma cosmovisão reformada, Wolters agora trata sobre a Queda. Ele nos mostra que o pecado de Adão não foi apenas um ato isolado que atingiu somente ele e seus descendentes, mas toda a criação no sentido terreno. Ele cita Rm 8.22 como texto-prova.
Sua tese principal nesse capítulo é que ao criar Deus estabeleceu sua lei sobre toda a criação, é o que ele chama de estrutura e direção, ou seja, Deus criou tudo com uma estrutura e para seu bom funcionamento estabeleceu como deveria funcionar, a direção. Lembra os símbolos de Westminster (criação e providência). No entanto, com a entrada do pecado e a rebelião do homem, foi dado direções pecaminosas à estrutura dada por Deus devido à corrupção do ser humano. Segundo Wolters, “Deus força a sua reivindicação sobre nós na estrutura da sua criação, qualquer que seja a nossa direção” (p.72)
No capítulo sobre a Redenção (4), o autor mostra que uma vez que a criação e a queda envolve todo o cosmo, a redenção é cósmica, pois seu propósito é restaurar toda a criação. Ele divide a redenção em duas partes. A primeira é a restauração, que tem o objetivo de restaurar ao que era antes da queda. Não é restaurar a uma coisa nova, mas ao que era antes. E a segunda questão que envolve a restauração é que esta traz implicações para toda a criação, e não a apenas uma parte dela. Essa compreensão mais ampla da redenção revela que não se restringe à esfera pessoal ou eclesiástica, mas também social e cultural. Ele compreende a restauração da criação como a vinda do Reino de Deus. “... a salvação em Jesus Cristo no sentido mais amplo, significa uma restauração da cultura e da sociedade no seu atual estágio de desenvolvimento” (p.87).
Critica outras cosmovisões cristãs como reducionismo do propósito bíblico da redenção, tais como o pietismo, com sua visão de que o Reino é a igreja institucional; os dispensacionalistas, com sua visão de reino futura; o liberalismo clássico e a teologia da libertação.
O capítulo final “Discernindo estrutura e direção”, Wolters traça algumas implicações da cosmovisão reformada para vida social, pessoal e cultural dos crentes. Ou seja, as distorções na direção ao propósito estrutural original e permanente de Deus devem ser novamente canalizadas para os propósitos de Deus. Ele trata do redirecionamento estrutural na questão da santificação, família, agressividade, dons espirituais, sexualidade, dança (ele entende que há algo de estrutural na dança, que deve ser redirecionada pela redenção, mas não fala onde deve ser usada).
Ele conclui o livro dizendo que buscou “ressaltar que a cosmovisão reformada que consideramos requer uma filosofia reformada que possa relacionar os critérios básicos de uma perspectiva bíblica à base de uma filosofia sistemática que seja relevante às disciplinas especiais da universidade” (p.126).
Enfim, Wolters aplica que a restauração do pecador e da sociedade por meio de Jesus Cristo deve se coadunar com a estrutura original da criação, ou seja, os aspectos espiritual, social e cultural devem ser direcionados por essa cosmovisão cristã reformada toda abrangente que a Palavra de Deus nos revela.

Robson Rosa Santana

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