17 de maio de 2018

O Universo ao Lado | James W. Sire: um resumo


SIRE, James W. O Universo ao Lado: um catálogo básico sobre cosmovisão. Trad. Fernando Cristófalo. 4 ed. São Paulo: Hagnos, 2009. Original em inglês: The Universe next Door (2004).

O livro Universo ao Lado teve sua primeira edição em 1976, o que dista da sua última edição em inglês vinte e oito anos. E como algumas cosmovisões estavam ainda tomando forma, como o Movimento da Nova Era e Pós-modernismo, Sire faz alguns atualizações baseadas no conhecimento mais profundo que o intervalo entre a primeira e quarta edição em inglês produziu. Fundamenta as cosmovisões citando vasta pesquisa bibliográfica.
O que Sire faz nesse livro é mostrar as cosmovisões mais importantes que ainda estão em atuação no mundo, com o propósito de os leitores tomarem uma decisão pela cosmovisão que tenha mais coerência e não se contradiga. Nesse caso, como cristão, apresenta a cosmovisão do teísmo cristão como a mais convincente.
São oito as cosmovisões básicas examinadas: (1) teísmo cristão, (2) deísmo, (3) naturalismo, (4) niilismo, (5) existencialismo, (6) monismo panteísta oriental, (7) nova era e (8) pós-modernismo. Se o niilismo que é a negação de qualquer cosmovisão não for contada, são sete. São nove se o existencialismo for contado como duas, uma vez que é divido em ateísta e teísta. Ou até mesmo dez, contando com a breve explanação do animismo.
Na introdução, Sire diz que aperfeiçoou seu conceito de cosmovisão: “Uma cosmovisão é um comprometimento, uma orientação fundamental do coração, que pode ser expressa como uma história ou um conjunto de pressuposições (hipóteses que podem ser total ou parcialmente verdadeiras ou totalmente falsas), que detemos (consciente ou subconscientemente, consistente ou inconsistente) sobre a constituição básica da realidade e que fornece o alicerce sobre o qual vivemos, movemos e possuímos nosso ser” (p.16).
Para ele são sete as questões básicas da maioria das cosmovisões, pelas quais ele tenta definir as cosmovisões analisadas. As questões básicas são as seguintes: (1) O que é a realidade primordial, qual seja, o que é realmente verdadeiro? (2) Qual a natureza da realidade externa, isto é, o mundo que nos rodeia? (3) O que o ser humano é? (4) O que acontece quando uma pessoa morre? (5) Por que é possível conhecer alguma coisa? (6) Como sabemos o que é certo e errado? (7) Qual é o significado da história humana? No entanto, nem todas as cosmovisões respondem a todas as perguntas.
O capítulo 2 aborda as questões do Teísmo Cristão, onde ele as responde da seguinte forma: “(1) Deus é infinito e pessoal (trino), transcendente e imanente, onisciente, soberano e bom. (2) Deus criou o cosmos ex-nihilo para operar com uma uniformidade de causa e efeito e um sistema aberto. (3) Os seres humanos são criados à imagem de Deus e, portanto, possuem personalidade, auto-transcendência, inteligência, moralidade, senso gregário e criatividade. (4) Os seres humanos podem conhecer tanto o mundo que os cerca quanto o próprio Deus, porque ele colocou neles essa capacidade e porque ele desempenha um papel ativo na comunicação com eles. (5) Os seres humanos foram criados bons, porém, devido à queda a imagem de Deus tornou-se desfigurada, embora não tão destruída de modo a não ser mais passível de restauração; através da obra de Cristo, Deus redimiu a humanidade e começou o processo de restaurar as pessoas à bondade, muito embora qualquer pessoa possa escolher rejeitar essa redenção. (6) Para cada ser humano a morte representa tanto o portão para a vida com Deus e seu povo quanto para a separação eterna da única coisa que poder satisfazer as aspirações humanas definitivamente. (7) A ética é transcendente e alicerçada no caráter de Deus como bom e (santo e amoroso).”
No capítulo 3, acerca do Deísmo, conclui com as respostas: “(1) Um Deus transcendente, como primeira causa, criou o universo, mas, então, o deixou funcionar por conta própria. Deus é, portanto, não imanente, não totalmente pessoal, não soberano sobre os assuntos humanos e não providencial. (2) O cosmo criado por Deus é determinado, pois foi criado como uma uniformidade de causa e efeito em um sistema fechado; nenhum milagre é possível. (3) Os seres humanos, embora pessoais, fazem parte do mecanismo do universo. (4) O cosmo, este mundo, é compreendido como estando em seu estado normal; ele não é decaído ou anormal. Podemos conhecer o universo e por meio de seu estudo determinar como Deus é. (5) A ética é restrita à revelação geral; pelo fato de o universo ser normal, ele revela o que é certo. (6) A história é linear, pois o curso do cosmo foi determinado na criação”.
O capítulo 4 trata da cosmovisão do Naturalismo, e tem como respostas às questões básicas: (1) A matéria existe eternamente e é tudo o que há. Deus não existe. (2) O cosmo existe com uma uniformidade de causa e efeito em um sistema fechado. (3) Os seres humanos são “máquinas” complexas; a personalidade é uma interrelação de propriedades químicas e físicas ainda não totalmente compreendidas. (4) A morte é a extinção da realidade e da individualidade. (7) A história é uma corrente linear de eventos ligada por causa e efeito, porém, sem uma proposta abrangente. Tem como teóricos maiores Darwin e Marx. O naturalismo na prática desembocou no (1) Humanismo secular; e (2) Marxismo.
Quando trata do Niilismo no capítulo 5, as respostas àquelas questões básicas não existem. Pois é mais um sentimento do que uma filosofia. Na verdade, nega qualquer verdade filosófica, qualquer tipo de conhecimento e valor de todas as coisas. “Nega até mesmo a realidade de sua própria existência” (p.109). Em suma, nega a realidade de tudo. Essa negação de todas as coisas leva, inexoravelmente, à perda de significado. E como se vive sem significado para nada, até mesmo para si? Sem sentido algum para a existência. O que Sire faz é mostrar as incoerências dentre do niilismo teórico, bem como na incoerência dentro da sua epistemologia prática, apresentando, assim, tensões dentro desse “sentimento” de nada ser, nem existir.
No capítulo 6 aborda a cosmovisão existencialista como uma filosofia que transcende o niilismo. Tem duas formas básicas: ateísta e deísta.  Sendo que a primeira é uma parasita do naturalismo e a segunda, do teísmo. As respostas às questões básicas do existencialismo ateísta são: “(1) O universo é composto apenas de matéria, porém para o ser humano a realidade se apresenta em duas formas – subjetiva e objetiva. (2) Para os seres humanos a existência precede a essência; as pessoas fazem de si mesmas o que são. (3) Cada pessoa é totalmente livre com respeito à sua natureza e ao destino. (4) O altamente elaborado e firmemente organizado mundo objetivo se coloca contra os seres humanos e parece absurdo. (5) No pleno reconhecimento e contra o absurdo do mundo objetivo, a pessoa autêntica deve revoltar-se e criar valores.”. Quanto ao existencialismo teista: “(1) Deus é infinito e pessoal (trino), transcendente e imanente, onisciente, soberano e bom. (2) O pessoal é que possui valor. (3) Os seres humanos são seres pessoais que, quando chegam à plena consciência, descobrem-se em um universo hostil; Se Deus existe ou não é uma questão difícil a ser resolvida, não pela razão, mas por meio da fé. (4) O conhecimento é subjetividade; a verdade total é com freqüência, paradoxal. (5) A história como registro de eventos é incerta, sem importância, mas a história como modelo, tipo ou mito a ser feito presente e vivenciado é de suma importância”. Há 2 passos além do teísmo tradicional: 1) desconfia da precisão histórica e 2)  perde o interesse em sua facticidade e enfatiza a sua implicação ou significado religioso].
O Monismo Panteísta Oriental é analisado no capítulo 7. Assim como o Movimento da Nova Era, não possui uma base doutrinária básica ou unificada, isto é, há algumas vertentes dentro da própria cosmovisão. Principais questões são respondidas da seguinte forma: “(1) Atma é Brahma, isto é, a alma de cada um e de todo o ser humano é a alma do cosmo. (“Deus” é a realidade única, infinita, impessoal e suprema, p.183). (2) algumas coisas são mais únicas que outras. (3) Muitos (se não todos) caminhos levam ao um. (Daí surge a idéia: “todos as religiões levam ao mesmo fim. Ao Um com a divindade. (4) perceber a unidade com o cosmo é ir além da personalidade. (Já que a realidade última – Atma – é impessoal. No final das contas o ser humano é em essência impessoal. (5) Perceber a unidade de alguém é ir além do conhecimento. O principio da não contradição não se aplica onde a suprema realidade está relacionada. (em outras palavras o ser é incognoscível e a verdade não existe). (6) Perceber a unidade com o cosmo é ir além do bem e do mal; o cosmo é perfeito a todo o momento. (7) A morte é o fim da existência pessoal, individual,mas não altera em nada de essencial na natureza do indivíduo (há imortalidade, mas não pessoal e individual). 8. Perceber a unidade com o um é ir além do tempo. O tempo é irreal. A história é cíclica.” Perceber a própria divindade é transcender a história. A seguir faz uma distinção entre o hinduísmo não dualista e o zen budismo. Por fim, Sire advoga que há um problema de comunicação com o Ocidente por ser as cosmovisões totalmente divergentes, embora muitos ocidentais estejam bebendo sedentos da cosmovisão oriental panteísta.
 O capítulo 8 aborda a cosmovisão do Movimento da Nova Era. Até aqui as cosmovisões têm suas origens no Ocidente, ao passo que a Nova Era é um “estrangeirismo” do oriente. Isso exige uma mudança grande no modo de pensar ocidental. Muitas das respostas apresentadas são difíceis de compreender pela tradição filosófica do Oeste. Ainda é um cosmovisão em desenvolvimento sem conceito unificado. Vejamos as respostas condensadas de Sire: (1) Qualquer que seja a natureza do ser (idéia ou matéria, energia ou partícula), o eu é o centro, a realidade fundamental. Como os seres humanos crescem em sua consciência e compreensão desse fato, a raça humana está no limiar de uma transformação radical na natureza humana; mesmo agora vemos alguns precursores da humanidade transformada e protótipos da Nova Era. (2) O Cosmo, embora unificado no eu, é manifesto em duas dimensões mais: o universo visível, que é acessível por meio da consciência comum, e o universo invisível (ou mente expandida), acessível por estados alterados de consciência. (3) A essência da experiência da Nova Era é a consciência cósmica, na qual categorias comuns de espaço, tempo e moralidade tendem a desaparecer. (4) A morte física não é o fim do eu; sob a experiência da consciência cósmica, o temor da morte é removido. (5) Três atitudes são consideradas para a questão metafísica da realidade sob o quadro geral da Nova Era: (1) a versão oculta, na qual os seres e coisas percebidos em estados alterados de consciência existem à parte do ser que é consciente, (2) a versão psicodélica, na qual essas coisas e seres são projetos do eu consciente e (3) a versão relativista conceitual, na qual a consciência cósmica é a atividade consciente de uma mente, utilizando um dos muitos modelos incomuns para a realidade, nenhum dos quais é “mais verdadeiro” do que qualquer outro”.
Por fim, é abordada a cosmovisão do Pós-modernismo. Respostas às questões básicas: “(1) A primeira questão que o pós-modernismo suscita não é o que está lá ou como sabemos o que está lá, mas como a linguagem funciona para construir significado. Em outras palavras, há uma mudança nas ‘primeiras coisas’ de ser para saber, para construir significado. (2) A verdade sobre a própria realidade está para sempre oculta de nós. Tudo o que podemos fazer é contar histórias. (3) As histórias propiciam às comunidades o seu caráter de coesão. (4) Todas as narrativas mascaram um jogo pelo poder. Qualquer narrativa utilizada como metanarrativa torna-se opressiva. (5) Não há substancial. Os seres humanos fazem de si mesmos o que são pelas linguagens construídas sobre eles mesmos. (6) A ética, como o conhecimento, é uma construção lingüística. O bem social é tudo que a sociedade assume ser.  (7) O pós-modernismo é instável.”
Não posso analisar com maior propriedade as cosmovisões abordadas, com exceção do Teísmo cristão. Nessa cosmovisão, Sire diz que não entraria na questão das divergências internas, como predestinação versus livre arbítrio (p.45), no entanto, deixa claro sua posição arminiana (p.43), e parece crer num universo aberto, lembrando o teísmo aberto (p.32-35).


Pr. Robson Rosa Santana
Igreja Presbiteriana do Brasil

Um comentário:

Você pode comentar aqui se quiser